segunda-feira, 12 de maio de 2014

Mestre João Pequeno

Mestre João Pequeno, (Araci, 27 de dezembro de 1917 - Salvador, 9 de dezembro de 2011)



João Pereira dos Santos, nascido em 27 de dezembro de 1917, em Araci, cidade situada ao norte de Feira de Santana, filho de Maria Clemença de Jesus, ceramista, e  de  Maximiliano Pereira dos Santos cuja profissão era vaqueiro na Fazenda Vargem do Canto na Região de Queimadas, passou boa parte de sua vida na área rural. 

Descendente de africano e índio, parente do famoso Besouro Mangangá, primo de seu pai, João sempre teve índole corajosa. Inclusive, quando mais jovem, buscou o exército, pois soube que lá se treinava constantemente. No entanto, João não foi admitido pelas forças armadas.   

Aos quinze anos fugiu da seca a pé, indo até Alagoinhas seguindo depois para Mata de São João onde permaneceu dez anos e trabalhou na plantação de cana de açúcar como chamador de boi, então conheceu Juvêncio na Fazenda são Pedro, que era ferreiro e capoeirista, foi aí que conheceu a capoeira. Neste momento ele constata, “essa coisa ta pra mim”.

Aos 25 anos, se vendo liberado por seus pais para seguir seu caminho, João se estabelece na cidade de Salvador, em janeiro de 1943. onde trabalhou como condutor (cobrador) de bondes e na construção civil como servente de pedreiro, chegando a ser mestre de obras.

Foi na construção civil que um colega de nome Cândido, ao notar o interesse de João pela Capoeira numa brincadeira no intervalo do trabalho, indicou o feirante, mestre Barbosa para introduzi-lo na arte , Barbosa dava os treinos, juntava um grupo de amigos e nos finais de semana ia nas rodas de Cobrinha Verde no Chame-chame. 

Certo dia, presente numa roda no Terreiro, chegou um senhor dizendo que queria organizar a Capoeira, convidando aos interessados a comparecerem ao Bigode, antiga fábrica de sabonetes Cicó. Chegando lá, João se inscreveu na academia passando a seguir os passos daquele que viria a ser um grande mestre, o Sr. Vicente Ferreira Pastinha. Logo após, João é elevado à categoria de treinel, ensinando a todos que por ali passaram.  

Isso foi por media de 1945, algum tempo depois João Pereira tornou-se então João Pequeno. No final da década de sessenta quando Pastinha não podia mais ensinar passou a capoeira para João pequeno dizendo: “João, você toma conta disto, porque eu vou morrer mas morro somente o corpo, e em espírito eu vivo, enquanto houver Capoeira o meu nome não desaparecerá”. 

Na academia do Mestre Pastinha, João Pequeno ensinou capoeira a todos os outros grandes capoeiristas que dali se originaram e mais tarde tornaram-se grandes Mestres, entre eles João Grande, que tornou-se seu Grande parceiro de jogo, Morais e Curió. Foi aconselhado pelo Mestre Pastinha a trabalhar menos e dedicar-se mais a capoeira. Embora pensasse que não passaria dos 50 anos percebeu que viveria bem mais ao completar tal idade. Tendo que enfrentar a dureza da cidade grande, João Pequeno também foi feirante, e carvoeiro chegou a ser conhecido como João do carvão, residiu no Garcia, e num barraco próximo ao Dique do Tororó. 

Sua primeira esposa faleceu, mas, um tempo depois conheceu Dona Mãezinha no Pelourinho, nos tempos de ouro da academia de seu Pastinha, constituíram família, e com muito esforço construíram uma casa em fazenda Coutos, Lá no subúrbio, bem longe do Centro onde foram morar e receber visitas de capoeiristas de várias partes do mundo. 

Para João Pequeno o capoeirista deve ser uma pessoa educada “uma boa árvore para dar bons frutos”. Para quem a capoeira é muito boa não só para o corpo que se mantém flexível e jovem, mas também para desenvolver a mente e até mesmo servir como terapia, além de ser usada de várias formas, trabalhada como a terra, pode-se até tirar o alimento dela. 

João Pequeno vê a capoeira como um processo de desenvolvimento do indivíduo, uma luta criada pelo fraco para enfrentar o forte, mas também uma dança, cuja qual ninguém deve machucar o par com quem dança, defende a ideia que o bom capoeirista sabe parar o pé para não machucar o adversário. 

Em 1970, Mestre Pastinha assim se manifestou sobre ele e seu companheiro João Grande: "Eles serão os grandes capoeiras do futuro e para isso trabalhei e lutei com eles e por eles. Serão mestres mesmo, não professores de improviso, como existem por aí e que só servem para destruir nossa tradição que é tão bela. A esses rapazes ensinei tudo o que sei, até mesmo o pulo do gato".

Algum tempo após a morte do mestre Pastinha, em 1981, o mestre João Pequeno reabre o Centro Esportivo de Capoeira Angola (CECA) no Forte Santo Antônio Alem do Carmo (1982), onde constitui a nova base de resistência, onde a capoeira angola despontaria-se para o mundo, embora encontrando várias dificuldades para manutenção de sua academia, conseguiu formar alguns mestres e um vasto número de discípulos, deixando sempre claro em sua fala, “enquanto houver Capoeira o nome de seu Pastinha não desaparecerá”

Na década de noventa houve várias tentativas por parte do governo do estado em desocupar o forte Santo Antônio para fins de reforma e modificação do uso do forte, paradoxalmente em um período também em que foi amplamente homenageado recebendo o título de cidadão da cidade de Salvador pela câmara municipal de vereadores, Doutor Honoris Causa pela universidade de Uberlândia, e Comendador de Cultura da República pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. 

Além de ser de impressionar a todos que tiveram a oportunidade de vê-lo jogar com a sua excelentíssima capoeira e mandigagem, João Pequeno destacou-se como educador na capoeira, uma autoridade maior na capoeiragem de seu tempo, um referencial de luta e de vida em defesa da nobre arte afrodescendente.